A Câmara de Vereadores de Piracicaba deve enviar ao Congresso Nacional moção de apelo pedindo para que seja revista a proposta de alteração no texto original da meta 4 do PNE (Plano Nacional de Educação), que vem sendo chamada de "inclusão radical". A mudança será votada em breve pelo Senado, embora venham ocorrendo seguidos adiamentos.
O entendimento do que está em jogo passa pelo conhecimento do texto original da meta 4 do PNE, que prevê a inclusão de alunos de 4 a 17 anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação preferencialmente na rede regular de ensino, garantindo, no entanto, o suporte público para escolas especializadas e entidades sem fins lucrativos que realizem o atendimento a esse público, como as Apaes (Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais).
Porém, a alteração no texto da meta 4 feita pelo senador José Pimentel (PT-CE), embora preveja a inclusão, congela de forma indireta, a partir de 2016, o repasse a essas entidades dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Na avaliação das Apaes, a modificação, caso aprovada, vai comprometer gravemente o trabalho de escolas e instituições especiais.
Por isso, cerca de 30 pessoas ligadas à associação em Piracicaba ––entre funcionários, monitores e crianças atendidas–– participaram de uma manifestação na manhã desta quarta-feira (14). Levando cartazes com frases dirigidas à presidente Dilma Rousseff, elas caminharam pela rua Governador Pedro de Toledo e chegaram à Câmara, onde foram recebidas pelos vereadores João Manoel dos Santos (PTB), Pedro Kawai (PSDB) e José Antonio Fernandes Paiva (PT).
"Estamos fazendo essa mobilização porque corre no Congresso uma proposta que quer acabar com a educação nas Apaes.
Não se pode ser radical assim", disse Cleusa de Lima, diretora-geral da Apae de Piracicaba. Ela disse que a entidade, sempre que possível, faz a inclusão de seus alunos em escolas convencionais, mas lembrou que a maior parte deles precisa do atendimento oferecido por um estabelecimento especial.
"Há alunos que temos condição de incluir nas escolas regulares, mas há muitos que não. Como diretora, acharia ótimo que a criança passasse meio período na Apae e meio período na escola convencional. Eu concordo com a inclusão, mas não radical, como estão propondo", completou Cleusa, que informou que, no ano passado, oito alunos foram inseridos em escolas regulares, porém três não se adaptaram e tiveram de voltar.
Para a diretora da Apae de Piracicaba, instituição que cuida de 300 crianças, a proposta que tramita no Senado põe em risco a continuidade do trabalho da entidade, com cerca de 2 mil unidades no Brasil. "Muitas crianças ficarão em casa, porque não têm condição de ir à escola regular. Em todas as reuniões a que vou, minha sugestão sempre é essa: a criança deveria ir de manhã à Apae e, à tarde, à escola, para poder ter o apoio de que precisa. Porque, se ela ficar abandonada dentro de casa, não vai aprender nada, nem na parte da saúde, nem na educacional."
A moção de apelo da Câmara de Piracicaba contrária à alteração no texto da meta 4 do PNE será apreciada na reunião ordinária da noite desta quinta-feira (15). O documento chegou a entrar na pauta nas duas últimas sessões, mas foi retirado para adaptações ––a moção seria, originalmente, de repúdio. "A Câmara de Vereadores toda vai assinar essa moção de apelo, que fica mais forte para sensibilizar o Ministério da Educação", comentou o vereador Pedro Kawai (PSDB), redator da propositura, que disse ser "totalmente contrário à inclusão radical".
"A inclusão deve ser feita, sim, mas de uma maneira bem tranquila, para que não afete o atendimento às crianças. Sabemos que há crianças que precisam de um atendimento diferenciado, com acompanhamento psicológico e pedagógico bem próximo, mas, colocando-as numa escola convencional, no meio de 30, 40 alunos, elas não vão ter esse atendimento diferenciado e, com isso, passarão, na verdade, a ser excluídas, deixadas de lado. E não é isso o que queremos para as nossas crianças da Apae; queremos a inclusão segura, para que não sejam prejudicadas em seu atendimento", afirmou Pedro Kawai.
Presidente da Câmara, João Manoel disse que, além de votar favoravelmente à moção de apelo, vai procurar o deputado federal Campos Machado (PTB-SP), seu correligionário, para pedir à sigla, que apoia o governo Dilma Rousseff, que converse com o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, para que seja revista a ideia de mudança no PNE.
"Acredito que o governo federal não tem esse intuito de acabar [com o apoio às escolas de educação especial]; o que está em jogo é saber de onde vem essa verba para as Apaes. Essa discussão deve ser feita em qualquer governo. Hoje à noite entregarei cópia da moção ao Campos Machado para que faça gestão para que a bancada discuta com o Aloizio Mercadante a revisão dessa posição e que as Apaes continuem tendo o apoio, porque é uma causa justa."
"A Câmara de Piracicaba já tomou essa posição: todos os vereadores estão apoiando a Apae", comentou João Manoel, ao reafirmar a postura da Câmara em preferir o diálogo ao revanchismo. "Amanhã será aprovada essa moção de apelo, que tem um sentido muito maior, pois não podemos partir para esse revanchismo implantando hoje no Brasil. A nossa postura é apelar, discutir e abrir um diálogo franco com todo mundo, com respeito, porque é dessa maneira que conseguiremos apoiar a APAE, que, com certeza, sairá vitoriosa disso."